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As Parcerias Público-Privadas como motor de crescimento económico em Moçambique

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sem prejuízo de a Lei das Parcerias Público-Privadas (“PPP”) ter sido aprovada pela Assembleia da Républica em 2011 - Lei 15/2011, de 10 de agosto - e regulamentada por Decreto em 2012 (decreto 16/2012, de 4 de julho), as PPP são uma realidade em Moçambique há bastante mais tempo, em especial no sector dos portos e ferrovias. As PPP destacam-se atualmente como um mecanismo a que os governos recorrem para financiar a realização de infraestruturas públicas, e Moçambique não é exceção. 


A lei moçambicana define as PPP como um “Empreendimento” levado a cabo em áreas de domínio público ou de prestação de serviço público, no qual, mediante contrato e sob financiamento total ou parcial do parceiro privado, este obriga-se a realizar o investimento necessário e explorar a respetiva atividade/prestar serviços ou bens, cuja garantia de disponibilidade aos utentes compete ao Estado. 


A finalidade principal é a valorização económica dos bens patrimoniais e outros recursos nacionais integrados nesse “Empreendimento” e/ou a provisão eficiente, qualitativa e quantitativa de serviços e bens públicos aos utentes. 
A lógica é, portanto, recorrer ao financiamento e investimento de um parceiro privado para assegurar a satisfação de necessidades coletivas em infraestruturas públicas, como portos, estradas, aeroportos, silos, a produção de eletricidade ou para a prestação e gestão de serviços públicos, como a prestação de determinados cuidados de saúde, como os serviços de hemodiálise, de imagiologia ou análises clínicas. 


A opção pela PPP permite reduzir os custos do Estado e acomodar restrições orçamentais públicas, da mesma forma que o Estado beneficia da capacitação técnica e tecnológica, bem como da gestão eficiente do parceiro privado. Associada à eficiência estará o risco, que deve ser alocado à parte que esteja em melhor condições de o gerir. 
Com efeito, as medidas de alocação, mitigação e partilha de risco são um dos princípios orientadores das PPP, com expressa previsão no modelo pluricontratual que regerá a sua implementação. Sem prejuízo da autonomia das partes, a lei moçambicana propõe desde logo uma alocação de um conjunto de riscos “típicos” e que se encontram associados a este tipo de contratação, assegurando a sua correta aplicação. 


Há riscos que, pela sua natureza, são tendencialmente retidos no parceiro público, como o risco legislativo, o risco político, o risco de conflito de interesses de natureza institucional e o risco de concessão da terra e há outros riscos que tendem a ser transferidos para o parceiro privado, como o risco da procura, da oferta, o risco comercial, financeiro e cambial ou ainda o risco de impacte ambiental.


Um outro princípio orientador está relacionado com a liberdade e competividade empresarial do parceiro privado; o facto de haver investimento privado justifica, desde logo, que se permita a amortização do investimento efetuado. Por esse motivo, a PPP é contrato de duração prolongada, que deverá assegurar que o parceiro privado tenha liberdade na escolha dos meios necessários para a gestão da infraestrutura e/ou serviço público, por um período razoável e adequado para que o investimento possa ter retorno financeiro. 


A questão do prazo da PPP estará também diretamente relacionada com o facto de a PPP incidir sobre empreendimentos de raiz ou sobre empreendimentos já existentes e até operacionais, mas que serão ou objeto de reabilitação ou de gestão privada. 


Tal característica deverá justificar a opção por uma das três modalidades previstas na lei: o contrato de concessão, o contrato de cessão de exploração ou o contrato de gestão. 


De entre estas modalidades, o contrato de concessão (“BOT”, “DBOT”, “BOOT”, “DBOOT”, “ROT” e “ROO”) tende a ser o modelo mais típico e com um período de vida mais dilatado no tempo. A lei prevê que os contratos de concessão de empreendimentos de raiz possam ter um prazo de trinta anos, passível de renovação por mais dez anos. 


Se é verdade que o sucesso da PPP assenta, amiúde, na liberdade que é dada ao parceiro privado para a escolha dos meios necessários para a gestão da infraestrutura e/ou serviço público é essencial que seja o parceiro público a definir, de antemão, os objetivos que pretende que a PPP acautele. 


Por um lado, é fundamental que, em momento anterior ao lançamento da PPP, se realizem levantamentos e estudos de viabilidade, técnica, económico-financeira e ambiental sobre o objecto da PPP, o chamado “caso base”, e por outro lado é também importante que, num momento distinto, isto é, depois de adjudicado o contrato de PPP, estejam definidos mecanismos diversos de controle e de reporte, que permitam ao parceiro público monitorizar; se necessário intervir e avaliar o sucesso do modelo implementado. 


Estes mecanismos, quer sejam anteriores ou posteriores à escolha e selecção do parceiro privado, obrigam à realização de um conjunto de trabalhos preparatórios, numa fase anterior ao lançamento da PPP e que, sendo por vezes morosos, dispendiosos e exigentes (senão subvalorizados) importa conciliar com a urgência na implementação deste modelo. 
Em bom rigor, um caso base bem definido trará vantagens para ambas as partes no contrato de PPP: ao parceiro público, porque define corretamente os outputs e as metas a atingir e ao parceiro privado, porque lhe permite gerir melhor o risco comercial inerente à exploração e o investimento necessário para tornar o Empreendimento rentável e financeiramente sustentável. 


Na verdade, para que o Empreendimento seja financeiramente sustentável é necessário que o Estado assuma um determinado grau de compromisso. É muito comum que seja necessário que o Estado intervenha a priori, removendo restrições suscetíveis de comprometer a viabilidade e valorização económica do Empreendimento, o que é facilitado pelo facto de estes processos serem tratados ao mais alto nível governamental, com intervenção direta dos ministros com a tutela financeira e com a tutela sectorial. 


Além disso, verifica-se, com frequência, que o quadro jurídico existente tem de ser adaptado, porque há normas que têm efetivamente de ser modificadas para acolher os interesses em causa ou para agilizar procedimentos já existentes, que se querem ora expeditos e eficazes. 


A adaptação do quadro jurídico existente surge genericamente também como forma de proteger a posição das partes, em face da dimensão e impacto do Empreendimento para a economia e finanças do Estado e, em particular, para conferir segurança jurídica ao parceiro privado, que tende a ser uma entidade estrangeira, de outra jurisdição. 
Como em Moçambique a terra é propriedade exclusiva do Estado e não pode ser vendida, ou por qualquer outra forma, alienada, hipotecada ou penhorada, as PPP que incidam sobre recursos nacionais obrigam a que seja atribuído ao parceiro privado o Direito de Uso e Aproveitamento da Terra (“DUAT”), cuja validade está associada à implementação do Empreendimento e à actividade desenvolvida. 


A lei das PPP, complementada pela nova Lei de Investimentos, prevê igualmente que possam ser dadas garantias e incentivos ao parceiro privado, cuja contrapartida será, a jusante, a exploração eficiente e racional de bens e recursos nacionais e a partilha de benefícios com o parceiro público. 


Na verdade, um outro princípio orientador da PPP é a partilha de benefícios financeiros e sócio económicos do parceiro privado com o parceiro público. 


Os tipos e modalidades dos benefícios devem ser fixados casuisticamente em cada estrutura contratual, sem prejuízo de o regime legal das PPP prever desde logo que uma determinada percentagem do capital social do parceiro privado, normalmente um veículo criado para o efeito, seja reservada para o Estado moçambicano, para pessoal coletivas públicas ou privadas moçambicanas e pessoas singulares moçambicanas. 


Ainda em sede de benefícios financeiros a favor do parceiro público, prevê-se igualmente que o parceiro privado pague taxas, com componentes fixas e variáveis, estando estas últimas indexadas às receitas da exploração (e incidentes sobre a receita bruta líquida de impostos indiretos relativa à faturação), que revertem a favor do Estado moçambicano. Estas taxas são também uma fonte de riqueza para o Estado moçambicano, que se afigura um dos principais interessados no sucesso do modelo PPP implementado.  


Se, num primeiro momento, o facto de o promotor do Empreendimento ser uma entidade estrangeira pode causar alguma estranheza, num segundo momento a experiência diz-nos que estas entidades trazem um conjunto de benefícios sócios-económicos para o parceiro público. O parceiro privado capacita tecnicamente o país; partilha a sua tecnologia e o seu “know how” com os moçambicanos; cria postos de trabalho; oferece programas de formação profissional a trabalhadores moçambicanos; faz crescer as Pequenas e Médias Empresas (“PME”) moçambicanas, mediante a contratação de bens e serviços e assume várias obrigações, em matéria de responsabilidade social, a desenvolver e implementar junto das comunidades locais.


Na verdade, de acordo com a Conta Geral do Estado referente ao exercício económico de 2023, no que respeita a criação de postos de emprego, os empreendimentos de PPP existentes em Moçambique empregaram um total de 5.905 trabalhadores, dos quais 5.834 nacionais e 71 estrangeiros e foram contratadas 1.674 PME’s para o fornecimento de bens e prestação de serviços. No âmbito da responsabilidade social, o valor total investido nas actividades levadas a cabo pelos empreendimentos de PPP foi de 3.645,41 milhões de Meticais. 


Estes números são reveladores do impacto positivo das PPP na economia de Moçambique, contribuindo ativamente para o crescimento económico do País.  

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Artigo por Mafalda Teixeira de Abreu, sócia contratada da Abreu Advogados (escritório parceiro em Portugal)

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